terça-feira, 17 de maio de 2011

Crônica ludopédica

Agora que já se definiram os campeões estaduais e o Brasileirão se aproxima, trago à baila algumas discussões acerca do nosso querido esporte bretão, o Ludopédio. Usando este termo português antigo, corro o risco de fazer o leitor pensar que esta crônica trata de um compêndio relativo à história do futebol. Não, não farei menção ao fato de que alguns historiadores remetem a invenção do futebol a 2500 a.C., quando soldados chineses faziam uma divertida partida com os crânios de seus inimigos decapitados.  Na história recente, financiados pelos donos de fábrica, o times do Arsenal (1886) e do Manchester United (1878) foram as primeiras agremiações nascidas em solo inglês. Um certo paulista filho de britânicos, chamado Charles Miller, trouxe o primeiro par de bolas com o livrinho de regras da terra da Rainha, nascendo oficialmente no Brasil o mais popular desporto coletivo do mundo, tornando-se a pátria das chuteiras.
 Não quero tampouco confundir a galera jovem com uma informação bombástica: já houve, segundo historiadores, um jogador brasileiro maior que Pelé: Friedenreich. Ele foi o primeiro grande jogador da história do nosso futebol e grande ídolo na era amadora. Segundo relatos, era um atacante de técnica única - alguns o consideram o inventor do drible curto e do chute dado com efeito. Ficou famoso pela sua garra em campo e recebeu o apelido de "El Tigre".  Alguns zagueiros que atuaram na mesma época que "Fried" afirmavam que ele era impossível de ser marcado. Com essas características, foi artilheiro várias vezes do Campeonato Paulista e, segundo alguns relatos, teria marcado 1.329 gols, o que o transformaria no jogador recordista de gols na história do futebol mundial.

Mas o que quero mesmo é voltar no tempo, mas não mais que 30 anos, na minha juventude, quando jogava futebol de campo e este era o esperado programa de domingo da família interiorana. O futebol era diferente, mais cadenciado e não menos emocionante. Primeiro, minhas referências eram bola branca e chuteira preta. E hoje? Uma parada de chuteiras coloridas que mais parece desfile de escola de samba. A bola, então, nem se fala. Cores, desenhos, formatos e um tal de "efeito aerodinâmico" que torna imprevisível a sua trajetória, como a famosa Jabulani. Naquele tempo passava-se sebo na bola para preservar as costuras feitas à mão e a bicha era um peso só. Vários goleiros tinham falanges quebradas e só faltava fazer um sorteio para ver quem iria ficar na barreira, para defender chutes de batedores históricos como Pepe, o "Canhão da Vila Belmiro", Nelinho, do Cruzeiro, Éder Aleixo, do Atlético MG, etc. Claro, com as mãos protegendo as partes...

A narração da TV era também bastante diferente. Assista a algum jogo da Copa de 70 e ouvirá: "Piazza........passa para o capitão Carlos Alberto........agora vem Tostão com ela..........Pelé........Jair recebe e avança.........Tostão novamente..................recua para Brito...". Hoje, os narradores tagarelam: "Evanilson Augusto rcebe pela ala direita, ele que chegou ao São Paulo em 13 de fevereiro de 2009, uma semana depois de completar 18 anos e de tirar sua carteira de motorista. Evanilson Augusto jogava de médio volante e foi pela primeira vez deslocado para este setor sob o comando de Robervalson de Oliveira Dantas. Evanilson se recupera de uma lesão no músculo adutor da coxa direita e passou 13 dias no departamento médico do clube. Evanilson Augusto toca para Deyvydsson Maxwell...". Eu fico sem fôlego pra eles!


Não dá. Sou do tempo em que os apelidos curtos imperavam, como Pelé, Tita, Zico, Pepe, Dadá, Zito...era muito mais fácil decorar a escalação do time - aliás, hoje é uma façanha, pois com o troca troca de jogadores o torcedor fica totalmente perdido! Gravar o primeiro nome já é um saco, agora vários vem com nome e sobrenome, ou nome e cidade de origem, ou nome e adjetivo - como Wellington Paulista, Túlio Maravilha, Marquinhos Paraná, Ronaldo Fenômeno, Adriano Imperador. Naquela época era Roberto Dinamite apenas. Já no interior era o nome do jogador primeiro e o nome da mãe depois: Gegê de Mariquita, João de Norma, Zezé de Dora. Fácil...


Na Bahia sempre se diz que se macumba valesse, o campeonato baiano sempre terminaria empatado. Hoje, no pré jogo em que a TV mostra as torcidas, o estádio, os repórteres de campo, uma cena chama a atenção: os jogadores, em sua maioria, não se contentam com o Pai Nosso gritado no vestiário. Ficam com as duas mãos levantadas para os céus, os olhos fechados à força, a boca nervosa entoando orações e hinos de louvor, pedindo ao Pai que interceda em favor de seu time e que o time vença a peleja. A quem Deus ouvirá? Todos os 22 jogadores estão em prece fervorosa, beijando os santinhos, então a quem ajudar? Aí, eu imagino a cena: chega São Pedro com um iPad e mostra as escalações direto da Internet para Deus. O diálogo seria mais ou menos assim:


__ Por São Jorge! Por que o Corinthians vai com esta zaga com André Vinicius e Paulo André (olha os nomes compostos aí...)?? - diz o Todo Poderoso. Assim vou ser obrigado a ajudar o São Paulo...
__ Valeu, Chefinho... - comemora o próprio.
__ Mas e o mala do Rogério Ceni? - pergunta São Jorge. Misericórdia...!
__ Então larga esses dois para lá e ajuda o Mengão - entra na conversa o São Judas Tadeu, com seu sotaque carioca.
__ Flamengo? Pelo amor de Deus - esbraveja São Januário lá do canto, puxando pro lado do Vasco.
__ Mas não ajuda o Atlético não, pois eles pintaram meu manto de preto - interrompe Nossa Senhora das Graças.
__ Mas isso foi em 2001, nós já fomos castigados com a maldição dos sete anos sem título! - vem uma intercessão lá da Terra, do atleticano Dom Serafim Fernandes de Araújo.
__ Chega de discussão - interrompe Deus. Lavo as minhas mãos. 


E ajuda o Santos...


sábado, 14 de maio de 2011

Gui


Simples assim: meu sobrinho Guilherme é popular. Sem esforço algum, o Gui arrebanha amigos e os envolve com sua risada estridente e prazerosa, assinando automaticamente um tratado de amizade eterna e intensa. Assim é o Gui.

Primogênito de Mario Veisac e Marli, o Gui nasceu dentro de uma geração espetacular de sobrinhos, que cresceram juntos nesta atmosfera de amizade e companheirismo. Ele é um símbolo desta turma, que até hoje se encontra para rodas de papo, churrasquinho e curtição da família. 

Sim, porque todos são muito família. Alguns até já tem sua própria, como é o caso de Monica, Lucas, Pedro Gustavo e Mariana, que começaram uma nova geração de bisnetos da dona Lívia, alguns a caminho.

Representei o Gui na bonita paisagem da Cachoeira das Andorinhas, em Ouro Preto, pois o cara é natureza pura; é só passear pelas suas páginas nas redes sociais e conferir imagens de escaladas, cachoeiras, etc. Suas madeixas loiras combinam bem com o límpido azul do céu das Minas Gerais...   

sábado, 7 de maio de 2011

Elias Layon - o pintor das brumas


Quem visita a histórica Mariana, em Minas Gerais, deveria, antes de percorrer a cidade, entrar no atelier do artista Elias Layon. De lá sairia com o olhar contaminado por uma imagem poética da cidade que a realidade está longe de proporcionar. Mais importante do que os casarios coloniais, na pintura de Layon as brumas são seu fundamento constitutivo. No rigor de cada composição, a palpabilidade do mundo desaparece e o motivo das brumas se impõe preponderantemente.

Na sua obra a cor, as linhas e as massas pictóricas refletem a essência dessa toalha fina de neblina fresca, a bruma, em sua profundidade, no seu aveludado, na sua maciez no seu odor. A cada nova tela do artista, o mundo se dissolve sobre os reflexos da bruma. A cidade parece transfigurada por uma atmosfera mágica. Layon não quer, portanto, revelar os mistérios da cidade, quer torná-la uma terra de mistérios.

Suas telas refletem cada pequeno espaço da cidade, de sua natureza, de suas luzes revelando o que eles têm de mais íntimo e sublime. Ao mergulhar em cada tela do artista parece que provamos do hálito de eternidade, levando-nos para além do tempo físico e nos mantendo suspensos numa atenção atemporal, diante de uma visão só possível de ser capturada pelos pincéis do artista.

Sua arte devolve à cidade de Mariana a sua condição perdida, condição poética que é redescoberta e iluminada pela arte, sabendo que é a obra de arte que a torna perene. O artista realiza o milagre de tornar cada pequeno facho de luz, cada movimento da neblina, cada frescor matinal e folhas de árvores que dançam ao sabor do vento, num edifício imenso de força viva, que transpira uma permanência indefinida. Provamos de uma alegria, que à simples lembrança de suas telas, sempre retorna. Pois, como dizia o poeta Keats, "uma coisa bela é uma alegria para sempre".

Mas nosso artista não apenas é pintor. Layon descobriu, após uma vida dedicada à pintura, a expressão artística da escultura. E essa descoberta da escultura já surpreende em sua riqueza de expressão e qualidade técnica.

Texto irretocável de Jardel Dias Cavalcanti